sábado, 30 de janeiro de 2010

Parece que foi ontem, parece que chovia


O dia era quatro de dezembro, o ano 2005, 6h da manhã. A ansiedade de estar em um jogo que podia valer mais um título para o timão era grande. Apesar de ser brasiliense, tive o privilégio de estar na final da Copa do Brasil de 2002 no Serejão contra o Brasiliense. Ali foi um verdadeiro batizado. Minha camisa preta do Corinthians tem as marcas de queimado das faíscas dos sinalizadores até hoje.

Depois de sair de casa, passei na casa do meu amigo Thiago, fiel corinthiano que está quase sempre presente comigo nos jogos do timão. O destino era Taguatinga. Dalí sairia cerca de dez ônibus cheios de fanáticos pelo time do povo. O jogo começaria às 16h, parecia estranho sair tão cedo (9h) de Brasília para uma viagem de menos de 3h. Mas com o Corinthians é tudo mais difícil. Devido a fiscalização, pessoas sem RG, menores de idade e outros problemas, a viagem para Goiânia, parecia que era para o Rio, vamos invadir o Maracanã novamente?

Muita batucada e festa durante toda a viagem. O ônibus respirava e cantava Corinthians. A chegada ao local do jogo foi tumultuada. Faltando apenas dez minutos para o início do jogo, o bus estacionou ao lado do estádio. Ingressos devidamente na mão, hora de enfrentar mais 15 minutos de fila. Lá atrás na fila, escuta-se uma voz, em meio aos gritos de CORINTHIANS, CORINTHIANS:

- Vamos rapaziada, o jogo vai começar. É Corinthians mêu!

Ao passar pelas catracas com o Thiago, hora de achar um lugar para ver o jogo:

- Bora Thiago.

- Não começou ainda, o gramado está cheio de gente.

Com as arquibancadas completamente lotadas, os fiéis torcedores se apertavam para arrumar um espaço para ver o jogo. Vendo rapidamente, parecia que as torcidas estavam divididas meio a meio, mas dava para perceber que a torcida do timão se espremia na sua parte do estádio, enquanto do lado verde do Goiás havia alguns espaços vazios.

Com atraso do início do jogo, vem uma notícia de um torcedor ao lado:

- Gol do Coritiba!

Festa geral no estádio. O Internacional precisava de uma goleada contra o Coritiba para tirar o título do Corinthians. O gol relâmpago antes do jogo do timão começar foi um alívio. Ali percebi que era só esperar os 90 minutos.

O que aconteceu todos sabem. Os “galácticos” comandados por Carlitos Tevez deram um show e apesar de não vencer, o timão fez a alegria do povão.

- Corinthians minha vida, Corinthians minha história, Corinthians meu amor.

Era o que gritavam os mais de 20 mil fiéis no Serra Dourada.

Novo Bandeirão

Pela última vez na história, os Gaviões da Fiel levantaram o seu lendário bandeirão que era na época o maior do mundo. Visivelmente desgastada, a bandeira estava cheia de remendos. Nada melhor que um título brasileiro como despedida. Tocá-la pela última vez foi um sonho.

Mas a história do bandeirão histórico não acabou ali. O adereço foi cortado em vários pedaços e vendido para vários torcedores como lembrança. O dinheiro arrecado foi destinado para criação de uma nova bandeira. Esta com 15 mil metros quadrados (250m x 60m), mostra por meio dos escudos corinthianos e também dos Gaviões, a história centenária do Poderoso Timão.

Por que estou escrevendo isto? O novo (bandeirão 5) será inaugurado domingo contra o Palmeiras no Pacaembu. Eu serei mais um louco do bando que estará subindo pela primeira vez a maior de todas as bandeiras do mundo.

É a história do Corinthians e de seu povo que nos faz ser diferentes dos outros...

... Teu passado é uma bandeira, teu presente é uma lição.

Gaviões da Fiel levanta metade do novo Bandeirão 5

segunda-feira, 11 de janeiro de 2010

O futuro da internet

O texto a seguir de José Paulo Cavalcanti de "O Estado de São Paulo" é uma ótima reflexão dos tempos de hoje e sobre o que supostamente vamos fazer com a internet. Ela foi criada com objetivo governamental e hoje está mudando o jeito das pessoas se comunicarem e até de se relacionarem. Confira o texto na integra.

O símbolo do herói moderno, para o filósofo italiano Umberto Galimberti (Il Gioco Delle Opinioni - O Jogo das Opiniões), deveria ser Ulisses, rei de Ítaca, por ter inventado o cavalo de Troia, em cujo ventre se esconderam soldados que à noite abriram as portas da cidade. Porque seria Ulisses portador dos valores básicos que se exigiria de uma sociedade moderna, mentira e astúcia. Retraduzindo essas palavras, para dar-lhes mínimos de dignidade, astúcia passa a ser a "capacidade de encontrar o ponto de equilíbrio entre forças contrárias". Enquanto mentir significa "habitar a distância que separa aparência e realidade"; e, também, "escapar da ingenuidade dos que acreditam que as coisas são, sempre, o que aparentam ser". Com Ulisses, inaugura-se a dupla consciência da realidade e sua máscara. É também o que se passa com a internet, na oposição aparentemente inconciliável entre o hoje e o amanhã. Posto que soluções dadas, atendendo ao que parece indispensável ou razoável no presente, serão capazes de comprometer irreversivelmente o futuro; enquanto a só espera plácida por esse futuro, hoje implausível, pode ser suficiente para degradar o presente a ponto de torná-lo intolerável.

O cenário desse aparente drama é que nos estamos convertendo em uma civilização impressentidamente nova, provavelmente nem pior nem melhor do que as anteriores. Apenas diferente. E talvez ainda não sejamos capazes de compreender, em toda a sua extensão, o "mito da idade da informação". São outros os valores, outros os padrões de organização social, outros os processos de transmissão de conhecimento, alterando as bases tradicionais da economia, da religião, da história, da própria cultura. E a questão já nem é saber se as novas tecnologias da informação vão alterar nossa maneira de viver, mas como o farão. Esse desenvolvimento extraordinário se processa em duas dimensões principais. Uma técnica, que corresponde à melhoria crescente na quantidade, na qualidade e na velocidade de transmissão da informação; outra cultural, interferindo em nossos padrões de convivência, produzindo o que François Brune (A Comunicação Social Vítima dos Negociantes) chama de "mercantilização do imaginário". Nossas cidades, não por acaso, são povoadas por cinderelas suburbanas que sonham, secretamente, com o fausto implausível de uma outra vida que nunca terão. Suspirando escondidas em seus quartos humildes, à espera do príncipe encantado em que se converte diariamente o galã da novela das 8, nas televisões; ou amigos, alguns próximos outros inatingíveis, nos orkuts da vida. Condenadas a viver vidas paralelas, como se a miséria de suas existências exigisse o contraponto desse eldorado a que se chega apenas girando um botão. Ou tocando algumas teclas.

Para o filósofo espanhol Ferrater Mora (Dicionário de Filosofia), "o paradoxo fascina porque propõe algo que parece assombroso seja como se diz que é". E o paradoxo, para a internet, é a pretensão de que deva ser, necessariamente, a única atividade livre de controles democráticos. Porque relações em comunidade são, sempre, construídas a partir de controles sociais. Temos interferências em todos os setores. No tráfego, só podemos dirigir com carteira de habilitação, o carro deve ser emplacado, o cinto de segurança é obrigatório, o sinal vermelho deve ser respeitado, temos contramão, estacionamento proibido, velocidade máxima permitida, e nunca ninguém pensou que esses limites possam violar a liberdade de locomoção, sagrada na Constituição como direito individual e cláusula pétrea. Sendo natural que algum tipo de controle social, democrático, se opere também em relação à internet. Um controle que decorrerá de sua inevitável regulamentação. A internet vai ser regulada quando estiver pronta para ser regulada. Vai mudar, precisamente, para poder ser regulada. Em outras palavras, vai poder ser regulada porque vai mudar. No futuro, claro, quando estivermos todos mortos, talvez. Provavelmente, deixando de ser a internet como a conhecemos hoje, para ser algo parecido. Mantendo só o nome. Ou nem isso.

Apenas para constar seja aqui dito que, no coração das pessoas, pouco a pouco foi-se dando a tragédia. Acabamos confiando nas máquinas cegamente. Primeiro no computador, claro. Depois na internet. Perdemos a razão crítica. Nos desacostumamos a questionar. Duvidar, para gente demais, acaba sendo heresia. Se Deus é onisciência, o novo deus da gurizada existe mesmo, e seu nome é Google (por enquanto). Segundo uma lenda moderna, máquinas não erram. Problema é que erram, por erro do programador ou por conta própria. Estamos desaprendendo a beleza de errar por nossos próprios erros. Tempos faz pesquisei onde estava a mesa, nos velhos romances; e era, sempre, o lugar mais importante da casa. O centro da vida familiar. Na sala de jantar de outros tempos nos olhávamos de frente, uns para os outros. Depois veio a televisão. A família passou a ficar no sofá, ombro a ombro, com a tela na frente. Depois de olhos nos olhos, orelha a orelha. Passamos a nos falar de lado. Sem mais dar importância ao brilho no rosto das pessoas queridas. Mas, na televisão, a gente ao menos está (quase) sempre acompanhado. Computador, ainda pior, é hábito de quem não gosta de olhar de frente. De quem não gosta de gente. Quantos de nós passamos noites inteiras na companhia dessas máquinas que só respondem o que lhes perguntamos? Sem mais tempo para encontrar os amigos. Para jogar dominó em fins de tarde. Estamos começando a viver o mundo terrível do futuro. A democracia da solidão. A conclusão dessa pequena fábula aqui contada, que nem fábula é, será só a de que essa internet de hoje vai mudar. Como também o homem que a digita. Mudarão os dois, pois. Para melhor? Não sei. Ninguém sabe.